8 de dezembro de 2005

Quanto custa... O rei... e o presidente

À beira das eleições presidenciais saiba quem sai mais caro e por que a presidência tem um orçamento 41,7% superior ao da Casa Real espanhola

Texto Rosália Amorim, Fernando Barciela

Só a palavra “monarca” está envolta em luxo, história e numa corte misteriosa e dispendiosa. Mas será que um presidente, apesar de não ter essa aura, constitui uma factura igualmente pesada? Será que até é mais gastador?

A EXAME fez as contas e comparou os gastos da Presidência da República portuguesa com as despesas da monarquia espanhola. A presidência pesa 13, 325 milhões de euros no Orçamento do Estado de 2005. Um aumento de 2,1% face ao ano anterior. Já entre 2003 e 2004 o Orçamento cresceu 7,7%, passando de 12,049 milhões de euros para 13,050 milhões.

A Casa Real espanhola teve um orçamento de 7,51 milhões de euros em 2004, este ano tem ao seu dispor 7,78 milhões, e para 2006 já está aprovado um orçamento de 8,048 milhões, ou seja, mais 3,5% do que no ano anterior. Aliás, nos últimos dois anos esta tem sido a taxa média de aumento do orçamento da Casa Real espanhola, menos do que todos os departamentos do Estado.

Tendo como referência 2005, temos do lado português 13,325 milhões de euros e do lado espanhol 7,78 milhões. Ou seja, a Casa Civil portuguesa gasta mais 41,7% do que a Casa Real espanhola.

Esta última é considerada até bastante poupada, tendo em conta os gastos das restantes casas reais europeias (veja tabela “Quanto custam outras Casas Reais da Europa”). Segundo especialistas que acompanham as famílias reais, a rainha de Inglaterra terá, só para gastos pessoais, cerca de 15 milhões de euros. Valha-lhe uma libra forte. O orçamento anual britânico, segundo dados revelados pelo diário espanhol El Mundo, ascende a 56,3 milhões de euros. Mas há outras Casas Reais europeias poupadas, à semelhança da espanhola. É o caso da dinamarquesa, que gasta 8 milhões de euros, e da holandesa e da belga, que consomem um pouco mais de 7 milhões cada uma.

(Leia mais na versão impressa da EXAME, n.º 259)
retirado de visão-online

8 de novembro de 2005

Escreve-se Na Blogosfera...

Aqui fica a nota de um artigo muito interessante, publicado a 06 de Novembro último, no Blasfémias e subordinado ao tema monarquia:

Liberalismo E Monarquia

Parece que timidamente, se começa a falar e a debater a questão de regime. Ainda bem!

28 de outubro de 2005

Aborto, TC considera inconstitucional proposta de referendo

Lisboa, 28 Out (Lusa) - O Tribunal Constitucional (TC) anunciou hoje que considera inconstitucional a proposta de referendo sobre o aborto aprovada pelo Parlamento, por entender que apenas em 15 de Setembro de 2006 se inicia uma no va sessão legislativa.

O diploma tinha sido aprovado pelo Parlamento a 28 de Setembro com os votos dos socialistas e do Bloco de Esquerda (BE), depois de o Presidente da República ter rejeitado, em Maio, uma proposta igual alegando que não havia garantia s de participação significativa na consulta popular em pleno Verão.

A Constituição estabelece que as propostas de referendo chumbadas pelo Presidente da República não podem ser renovadas pelo Parlamento na mesma sessão legislativa.

PS e BE argumentaram na altura que a 15 de Setembro se tinha iniciado uma nova sessão legislativa, enquanto a restante oposição considerou que a sessão se iniciou após as legislativas de Fevereiro e só termina a 15 de Setembro de 2006 - como agora entendeu o TC.

Quando enviou a proposta de referendo para o TC, o Presidente da República, Jorge Sampaio, pediu aos juízes que se pronunciassem sobre a validade da pergunta e sobre o início da sessão legislativa face às dúvidas surgidas quanto a esta matéria.

"Concorda com a despenalização da IVG, se realizada, por opção da mulher, nas primeiras 10 semanas, em estabelecimento de saúde legalmente autorizado?" foi a pergunta para o referendo aprovada pelo Parlamento, com os votos contra do PSD, PCP, CDS-PP e PEV.

IEL.
28-10-2005 17:29:00. Fonte LUSA. Notícia SIR-7445332

retirado de www.lusa.pt

25 de outubro de 2005

MONARQUIA, ou o dogma republicano


Falar de monarquia nos dias que correm é tabu. Todos o evitam, todos afirmam que não é oportuno, todos acham que é uma barbaridade pensar-se na monarquia como alternativa ao actual regime. E a opinião pública, os portugueses e o país conformam-se e pensam que de facto, só podemos viver numa república. Que em Fevereiro lá teremos que ir votar e que o país seguirá o seu caminho…
Mas a verdade é que existe uma alternativa, que pode ser discutida e que é tão válida, credível e racional como a actual (senão mais!).

Todos sabemos que o país atravessa uma grave crise, não só financeira, como também a nível social, destacando aqui, a pouca confiança na classe política que os portugueses têm vindo a manifestar, facto não desprovido de razão.
Mas se é verdade que a opção por um regime monárquico, não resolveria o problema do défice orçamental, nem resolveria o problema da tão necessária reforma da administração pública e muito menos acabaria com o desemprego, a verdade é que pode e deve ser debatido, a bem da democracia que todos apregoa-mos.
Não existe verdadeira democracia onde se nega a possibilidade de discussão, o que infelizmente acontece na sociedade portuguesa, mesmo que por detrás da máscara do não-oportunismo (para já não falar da al. b) do art.º 288.º da Constituição da República, referente aos limites materiais à sua revisão).

Pois bem, aproximam-se eleições presidenciais e dado o actual estado da nação não há qualquer desculpa para não se debaterem alternativas ao actual sistema, ainda mais quando vemos exemplos de sucesso ao nosso lado.
A minha sugestão é que se fale, se debata, que se diga bem e se diga mal, mas acima de tudo que se discuta de igual para igual as opções de regime que temos, a bem da democracia e a bem de Portugal. Ou será que a república e os republicanos (se ainda os houver verdadeiramente...) temem o debate?


in CRITÉRIO, edição de Outubro 2005

5 de setembro de 2005

VERÃO 2005, OU O FLAGELO DOS INCÊNDIOS

Já muito se disse, falou e escreveu acerca dos incêndios que mais uma vez voltaram a assolar o país de norte a sul, do interior ao litoral. É verdade que podemos sempre afirmar que se trata de uma ano de excepção, que a seca potencia a deflagração (voluntária ou natural) de incêndios, etc. mas a verdade é que 2003 também foi uma ano de excepção (devido a anormais comportamentos do anticiclone dos Açores), e que 2004 também não esteve muito longe deste estado de excepção. Resumindo, nos três últimos anos o país foi sendo consecutivamente consumido na época estival por incêndios de dimensões impressionantes.


O plano de prevenção e combate a incêndios do nosso país é algo de extraordinariamente confuso ou inexistente, e quanto a este ponto gostava de fazer algumas críticas e lançar algumas ideias.

Primeiro, há que acabar com esta visão sazonal do problema, uma vez que os incêndios se evitam em primeira linha através da limpeza, manutenção e organização da área florestal, se a floresta estiver limpa e organizada com os acessos bem rasgados e cartografados, ganhamos rapidez e eficácia no combate às chamas.

Em segundo lugar tem que se fazer uma opção definitiva sobre o equipamento aéreo que o país deve ter à disposição, e qual o meio de pagamento e financiamento dos mesmos. Se quanto ao tipo de equipamentos a escolha deve ser deixada aos técnicos competentes e não à classe política, já o financiamento é da exclusiva responsabilidade dos últimos, devendo ter-se em conta que o tempo perdido nos últimos três anos colaborou para os cerca de 745.000 hectares de área ardida (dados da DGRF), que correspondem a brutais perdas financeiras numa economia cujo PIB depende em cerca de 5% deste recurso natural. Quanto mais depressa a decisão for tomada melhor.

Em terceiro lugar, devemos repensar o sistema de financiamento das corporações de bombeiros. Num país onde a quase totalidade das corporações são voluntárias, é ridículo ter-se um sistema de subsídios estatais que, pelo menos em parte significativa, se baseia num cálculo sobre incêndios ocorridos, quando se pretende exactamente o inverso, que eles não deflagrem. Sem querer apontar o dedo a ninguém e muito menos às corporações de bombeiros (às quais o país deve tanto…) a verdade é que este sistema não incentiva o trabalho de prevenção. Em alternativa proponho que este cálculo de subsídios deveria basear-se num valor de 100% a que corresponderia a área de floresta a cargo da corporação, sendo o subsídio cortado consoante a percentagem de área ardida, podendo ainda pensar-se num sistema que premeie as corporações mais eficazes. Assim conseguia-se incentivar o trabalho de prevenção e uma maior eficácia por parte das corporações.

Em quarto lugar há que repensar toda a estrutura de comando e disposição geográfica dos meios de combate a incêndios. É inadmissível que se assista a sobreposições de competências, que não haja UM comandante nacional com funções verdadeiramente executivas (recordo aqui as declarações do comandante nacional em exercício, que definia a sua função como de moralização dos bombeiros) que se apoie numa cadeia de comando com não mais que três níveis, (1) um super-regional (correspondente à divisão do país em três sectores: norte, centro e sul), (2) um distrital e (3) um local (correspondente aos comandantes de corporação). Desta forma consegue-se uma cadeia de comando rápida e eficaz no que toca à mobilização geográfica de bombeiros para o combate às chamas e à gestão da actuação dos meios aéreos. Esta estrutura deveria responder directamente perante o ministro da tutela, na pessoa do comandante nacional.

Por último gostava só de fazer uma breve referência às alterações que se avizinham no regime do código penal. Apesar de ser favorável ao agravamento das penas de incendiários, parece-me que o importante era travar todos os possíveis interesses nas áreas ardidas, tais como a especulação imobiliária (em Espanha não se pode construir num espaço de 30 anos sobre área ardida!) e isso consegue-se através de legislação que verdadeiramente trave estes interesses.

18 de julho de 2005

Estado do Sítio

O enterro dos socialismos



Este sítio não está só muito mal frequentado como avança alegre e rapidamente para a falência. Algumas elites, as poucas que ainda vão existindo por estas terras, romperam com anos e anos de silêncios e cumplicidades e desataram a dizer umas tantas verdades que a maioria atira para debaixo do tapete o mais depressa possível, não vá o Diabo tecê-las e acabar com os arranjinhos políticos, económicos e sociais que transformaram este regime num colossal embuste.

João Salgueiro, uma figura insuspeita de não gostar do pântano nacional, afirma que o País é inviável há duas décadas. Fernando Ulrich, um respeitável banqueiro longe dos populismos de esquerda ou direita, diz que o modelo português ao nível político, económico e social não serve. Ou seja, o regime está podre e não se recomenda a ninguém. E para que não haja quaisquer dúvidas sobre o estado a que este sítio muito mal frequentado chegou, veio o ministro das Finanças do Governo socialista de José Sócrates dizer aos perplexos cidadãos que os investimentos públicos anunciados com muita pompa e circunstância no Centro Cultural de Belém, uma obra emblemática do cavaquismo e de como se gastam milhões a mais em Portugal, são um embuste tremendo. Campos e Cunha, numa forma muito original de vir a público dizer que está farto de ser ministro das Finanças, tem imensa razão quando escreve que hoje viveríamos melhor se certos investimentos não tivessem sido realizados.


O sítio está, portanto, a chegar a um beco sem saída. As elites já falam verdade e um ministro de Estado há quatro meses em funções prepara-se para voltar à universidade. Entretanto, a economia afunda-se, as despesas públicas disparam, o desemprego sobe e o povo, bem acompanhado pelo supremo magistrado da Nação, nem quer ouvir falar em crise. Uns vão para a praia e outros organizam greves, marchas e marchinhas na defesa de direitos irresponsavelmente concedidos por um Estado que já era inviável há duas décadas. Mas como em muitas situações na vida, há males que até vêm por bem.


Com um país falido, um regime moribundo, um povo cada vez mais velho e iletrado, começa a chegar a hora de se pôr tudo em causa. A começar pela arqueológica Constituição da República, um verdadeiro obstáculo às reformas, à modernidade e ao desenvolvimento. Mas como o Bloco Central do pantanal está verdadeiramente decidido a enterrar Portugal, importa obrigá--lo, pelas força das palavras, a referendar um texto fundamental que seja a primeira pedra de um novo regime. E de um novo modelo político, económico e social que enterre de vez os socialismos. Todos.



António Ribeiro Ferreira, in Diário de Notícias 18 de Julho de 2005

27 de junho de 2005

Agricultura, Alimentação e Saúde

Portugal Desperdiça Recursos Hídricos

Portugal continua a desperdiçar recursos hídricos como nenhum outro país da Europa, afirma o agrónomo António Campos, a propósito do livro «Agricultura, Alimentação e Saúde», a lançar na terça-feira pela editora Âncora, em co-autoria com Rui Azevedo.

António Campos chama a atenção para o agravamento das carências de água em algumas zonas do território português e para o avanço da desertificação no Sul, agravada pelos incêndios e pela erosão progressiva dos terrenos.

«Em Portugal, o problema da gestão dos recursos hídricos reveste contornos escandalosos porque os cursos de água não têm nenhum tipo de manutenção, de cuidados de defesa e de ordenamento nas suas margens, e a política florestal nacional é um atentado contra a água», sustenta.

Focando o caso específico do Alentejo e Algarve, o antigo eurodeputado socialista considera «uma irresponsabilidade política o fomento dos campos de golfe» naquelas regiões, onde a água assume uma importância decisiva.

Para além de legislação penalizadora para os grandes gastadores de água, Campos defende a intensificação do tratamento e reaproveitamento das águas dos esgotos urbanos, reportando-se à experiência de vários países da Europa onde se verifica uma gestão equilibrada de tais procedimentos, nomeadamente no caso dos espaços verdes urbanos, que são «irrigados com estas águas, que voltam a ter qualidade adequada depois de tratadas».

A dessalinização é outra alternativa que o autor acha necessário reequacionar, admitindo que «a prazo» há-de encontrar-se a forma de «transformar, a baixo preço, a água do mar em água potável», devendo até lá imperar a gestão sustentada deste recurso natural.

No capítulo dedicado ao modelo alimentar dos países desenvolvidos, o autor destaca que nesses países as «pessoas só consomem directamente 30 por cento dos cereais produzidos, destinando-se os restantes 70 por cento ao fabrico de rações para fomentar a produção intensiva de carne e leite», ficando a «matéria verde, cada vez mais destinada a ser destruída pelo fogo», quando podia ser usada na alimentação dos herbívoros, principalmente vacas, cabras e ovelhas. «Em vez disso, o modelo vigente promove que os animais sejam alimentados a rações», comenta.

António Campos critica as grandes empresas do sector agro-alimentar, que «promoveram um desenvolvimento fantástico da cadeia alimentar e a concentração da comercialização em multinacionais poderosíssimas», efectuando uma «integração vertical do sector, principalmente nas grandes produções objecto do comércio a longa distância», designadamente cereais, carne, oleaginosas, café, bananas e chá. E apresenta um gráfico das maiores dez multinacionais do ramo agro-alimentar, com as vendas anuais lideradas pela Cargill (EUA), com 55 mil milhões de euros, seguida da Nestlé (Suíça) e da Kraft (EUA), ambas com 42 mil milhões, da Unilever (Holanda/Reino Unido) com 32 mil milhões; depois, as norte-americanas Con Agra e a Pepsico, ambas com 30 mil milhões de euros de facturação anual.

António Campos é engenheiro técnico agrário e foi membro de vários governos do Partido Socialista - secretário de Estado do Fomento Agrário, secretário de Estado da Estruturação Agrária e secretário de Estado adjunto do primeiro-ministro. Rui Azevedo é agrónomo de formação e actualmente funcionário da Comissão Europeia. O prefácio é de Mário.




in Expresso Online, 27 Junho 2005 (15:05)

24 de maio de 2005

SIM à Europa, NÃO ao Tratado Constitucional


Desde 1950, com a declaração de Schuman, que União Europeia tal como a conhecemos hoje, tem vindo a ser construída exclusivamente pela sua classe política. O primeiro passo para a sua democratização dá-se em 1979 com as eleições para o parlamento europeu, convém lembrá-lo, assim como ao seu diminuto papel no seio das comunidades, com competências cada vez mais amplas, mas ainda assim diminutas.

Efectivamente os políticos europeus sempre viram esta ‘ingerência democrática’ com bastante desconfiança, dentro dos próprios Estados-membros, principalmente em período de eleições europeias, pouco ou nada se fala ou diz da UE, preferindo-se a discussão de problemas internos, tais como cartões amarelos ou xeque-mates aos governos. Nem a própria classe política nacional estimula o debate, alimentando ao invés as suas disputas nacionais.

A Convenção que redigiu e apresentou a primeira proposta deste ‘Tratado Que Institui Uma Constituição Para A Europa’ veio confirmar o modelo europeu de fazer política: Entre políticos! Houve no entanto quem quisesse aproveitar este novo tratado para legitimar o futuro da EU, algo que me surpreendeu positivamente, mas no fundo algo que já esperava. O que eu não esperava era que os europeus aproveitassem a oportunidades para se insurgirem contra este modo de ir construindo a sua UE!
De facto poucos ou ninguém o esperava, muito menos a nossa classe política, que para mais uma vez evitar o debate em torno da construção europeia marcou o referendo mais supranacional para a mesma data das eleições mais locais possíveis.

Como tal, o meu voto, será em 49% um SIM à Europa enquanto união de estados, enquanto motor de coesão social e económica, enquanto mercado comum e união monetária, mas será acima de tudo, em 51% um NÃO a este modelo de construção europeia, uma construção pouco clara e demasiado sinuosa.

P.S.: Se o tratado é ou representa a abertura de um federalismo europeu, será alvo de artigo posterior, prometo!

26 de abril de 2005

Alentejo

Entre Vistas,

de António Esteves, Jornalista

É por ele que vamos. Pelo silêncio de ouro, riqueza máxima da nossa paciência desgastada por dias e dias de uma guerra que vai crescendo em sobressalto. É por ele que vamos, pelo som ausente dessa angústia que nos enche o écran a cada hora - o som da guerra que mata. Na morte também há silêncio, mas nós procuramos a tranquilidade em vida, sem perigos nem desassossegos.


Procuramos um palmo de terra onde não descansaremos eternamente, e ainda bem, mas onde vamos pousar os esqueletos para um repouso mais que merecido. Alguém diz que é no Alentejo que sabe bem não fazer nada. Que lá o descanso rende mais que o petróleo do Iraque. Terra de molezas e outros prazeres, o Alentejo é também o aconchego de gente que trabalha de sol a sol e que não merece a fama de preguiçar desalmadamente. É nos rostos morenos de quem faz da planície morada permanente que está a prova de uma vida digna, de muito esforço e pouco ócio.


Os povos são o que são e adaptam-se ao clima que os acolhe. E se é verdade que este cantinho à beira do Atlântico é tão pequeno que se mede sem grandes trabalhos, também não será menos verdade que é possível encontrar climas diversos nesta nesga de pátria. E o alentejano - o clima - é impiedoso e castigador.


Ai de quem se obriga ao arar da terra debaixo do astro que abrasa e não perdoa nenhum descuido. Num destes verões, de costas a descoberto, parecia que uma labareda caída do céu me tinha vindo morder a pele. Apressei-me a ajeitar o agasalho e percebi o que deve sofrer quem tem de se sujeitar a horas sem conta a estes tormentos para plantar na planície o dourado que tanto amamos. É o verde que se queima depressa e nos dá as tonalidades próprias que baptizaram os campos de "planícies douradas". É por isso que as azinheiras e os sobreiros das anedotas são muito úteis para uma sesta ao fresco, não por preguiça, apenas para retempero das forças que faltam muito cedo.



Ai de quem não tenha água fresca trancada no cântaro de barro com rolha de cortiça para saborear numa das raras sombras que salpicam o horizonte queimado pelo brasido. Os alentejanos não preguiçam, repousam e retemperam-se para novas trabalheiras, essa é que é essa.



Saímos de manhã. Para ti já é tarde. Custa-me madrugar e para mim às dez é cedinho. Não há sol para aquecer a viagem mas vamos na mesma. A música quase não se ouve, mas as melodias vão embalando a viagem que decidimos fazer em marcha lenta. Estamos a saborear um dos raros momentos em que o relógio não marca o passo e por isso nem queremos saber o que dizem os ponteiros. Não dizem nada. Dizemos nós que queremos parar em Montemor para o almoço.


Por desventuras que agora não vêm ao caso acabamos em Évora, com o céu num choro diluviano e nós a correr pelas ruas de uma das cidades mais bonitas do país. Temos fome e acabamos abrigados perto da morada que o Luís Rêgo nos deu, à pressa, pelo telefone. Como é que um alentejano consegue falar tão depressa? Ele fala, em cinco minutos deu três sugestões e nenhuma servia. Mas que diabo não há restaurantes abertos em Évora aos sábados à tarde? Há sim senhor, diz o Rêgo. E se ele diz. Ele diz até muitas coisas, mas costuma acertar mais quando fala para a televisão. O Rêgo - diacho de apelido - é o homem da SIC no Alentejo, ele e o Xô Rebêro (Sr. Ribeiro) fazem uma parelha infernal de jornalistas. Logo hoje é que aquelas almas não acertam uma e nos fazem correr as ruas, belas sem dúvida, de Évora.


Abrigados no telheirinho do "Botequim da Mouraria" decidimos entrar. Meu Deus não pode ser! Estamos enganados. Pois estamos! É um café. Só tem balcão. É para almoçar? Pergunta um senhor de ar divertido. Era, mas já vi que não podemos. Podem sim senhor, façam favor de se sentar. Olha pois é, não há mesas. A um canto do balcão está o Fernando Madrinha, do Expresso. Bom sinal, penso eu. E pensei bem. Sendo o Expresso autor de um dos melhores guias que conheço, de quase tudo, estranho seria que um dos responsáveis pela coisa se deixasse enganar. Não deixou.


Logo na entrada uma coisa de que gostas tanto. Queijo. Mas este não é um queijo qualquer. A menina gostou? Hummm?! Xim, xim... Ai não gostou! Logo tu que adoras queijo. Mas este é sem dúvida algo de extraordinário. Este vai ao lume, fica derretido e leva um tempero delicioso. Só provando. Indescritível!


O sítio não é um restaurante comum, pode dizer-se que é um snack-bar com uma garrafeira de fazer inveja e muitos petiscos. Presunto de Barrancos, Farinheira Assada, Queijinho de Ovelha, Ovinhos de Codorniz com Paio de Porco Preto, Ovos Mexidos com Espargos Bravos e Torresmos de Rissol. Ao almoço, servem também pratos regionais, como Sopa de Cação, Migas de Espargos com Carne de Porco, e os pratos de Caça. Em sobremesas: Queijadas de Évora ou Encharcadas de Mourão. Na garrafeira exposta há, acredite ou não, praticamente todos os vinhos do Alentejo. Preço médio: 20 euros. Com vinho, como é evidente.


Já lá tínhamos passado de dia, mas voltámos para jantar à noite. O teu guia, que guardas com um desvelo religioso, diz que lá na terra - em Borba - há um restaurante que merece uma visita. Vamos nisso. Depois de um périplo alentejano estamos cansados e apetece um jantar com sabores da região para recuperar.
Monsaraz é terra bonita e abriu-nos o apetite. Vila Viçosa está cada vez mais bonita e elegante, vestida de mármores coloridos e muito polidos. Tem um ar frio, ainda mais hoje que chove a potes, mas deve ser um paraíso nos dias escaldantes no Verão. Estremoz também é terra de muitos atributos, mas já lá vamos. Agora estamos em Borba, nas ruas estreitas e encharcadas pelo temporal, de nariz levantado em busca da placa que não aparece. E de repente, sem querer, ouvimos um rumor que chega por uma fresta de uma porta mal fechada. Tu achas que é ali. E se tu achas é porque é mesmo. És de poucos enganos. Deve ser a tal intuição feminina. Era mesmo. Mais uma surpresa. Estamos numa adega gigante, com as enormes talhas encostadas à parede e meia dúzia de mesas a preencher a sala. Da cozinha sai um jovem cheio de genica e agradáveis iguarias num equilíbrio instável que acaba numa das mesas com gente ansiosa pelo petisco.


É uma adega especial onde ainda se fabrica o conhecido vinho da região. De aspecto simples e castiço, esta casa com bancos e mesas de madeira oferece uma enorme variedade de pratos típicos do Alentejo: Cacholeira Assada, Sopa de Cação, Bacalhau à Talha, Migas Alentejanas, Cacholas, Burras Assadas no Forno, Ensopado de Borrego, Cozido de Grão ou Carapaus Fritos com Miolos de Tomate. Para sobremesa: Sericáia com Ameixa, Leite-Creme com Bolacha, Doce de nata e Pudim de Ovos. Encerra de Agosto a Outubro. Nestes meses fabrica-se vinho lá na casa. E é óptimo!


O jovem, bem-humorado, fica satisfeito quando lhe dizemos que viemos aconselhados pelo roteiro da Visão que lhe atribui boa fama. Ai é? Bem já cá esteve o José Hermano Saraiva a gravar um programa. Lembram-se? Não nos lembramos. Agora isto. Um dia destes o Liedson marca um golo, levanta a camisola e lê-se: "Restaurante a Talha", em Borba. Teve graça o rapaz, mas não me parece. Os patrões da bola já acabaram com esse tipo de entusiasmos. Não lhe dizemos, depois de nos servir com tal simpatia não merece o desgosto. Preço médio, 5 euros. Parece mentira.


E depois de tantos atropelos à dieta, que juramos só trair aos fins-de-semana, acabamos em repouso no local que nos levou ao Alentejo. O Monte dos Pensamentos, em Estremoz. Os proprietários são simpáticos e afáveis, e o local tem o que procuramos, um silêncio quase total. Casa rústica e muito bem decorada dentro do estilo da região, tem todos os luxos que se pedem num local vocacionado para o turismo com cores rurais. Os preços são simpáticos e o conselho não pode ser outro: ideal para quem está em fuga desesperada da "canseira" urbana. Ali ao lado está Estremoz, cidade de muitos encantos e que merece uma visita atenta e demorada.


Quem vem de Estremoz, vira em direcção a Lisboa mas não entra na auto-estrada. Logo a seguir vira à direita e ALTO.... a 50 metros, rigorosamente, está a entrada do Monte. Se não abrandar acontece-lhe o mesmo que a nós... demoramos mais um bocadinho. Já sei miúda, a culpa é minha. Falta-me a intuição. És mesmo distraído! Pois sou!

António Esteves, in Opinião (20-4-2005), SicOnline (www.sic.sapo.pt)

19 de abril de 2005

Habemus Papam!

Acaba de sair o fumo branco da chaminé da Capela Sistina, onde se encontrava reunido o conclave de cardeais, que com este sinal indicam a eleição de um novo Papa.

O Papa eleito é o cardeal Joseph Ratzinger, que adoptou o nome de Bento XVI!

Na oração Urbi et Orbi, pronunciada da varanda principal da basílica de S. Pedro, na cidade do Vaticano, e perante largos milhares de fiéis que o aclamaram, O Papa Bento XVI pediu as orações dos fiéis pelo seu pontificado.

Viva el Papa!

8 de abril de 2005

A semana em revista

Esta semana foi claramente marcada pela morte do Papa João Paulo II, no último sábado, e que levou à concentração de milhares de peregrinos em Roma. Foram impressionantes as intermináveis filas de fiéis, que chegavam a esperar cerca de 15 horas para poderem prestar uma última homenagem a João Paulo II.
Hoje o mundo parou, e os sinos tocaram em todo o mundo, para um último adeus ao Papa, que foi hoje a sepultar na Cidade do Vaticano.

A par disto, a comunicação social portuguesa conseguiu acompanhar ao minuto o que se passava na Cidade do Vaticano, enchendo as suas emissões com as referidas 'notícias'.
Não deixa de ser triste notar que os 'Media' portugueses continuam bastante longe de serem a referência do jornalismo, de outra forma não se perceberia o facto de os principais telejornais, a emitirem em 'prime-time', dedicarem durante toda a semana cerca de 30 minutos dos blocos noticiosos a este tema, cobrindo e noticiando o necessário e o desnecessário. O que mais me inquieta não é o facto de isto ter ocorrido, mas sim o facto de situações idênticas serem uma constante na televisão portuguesa.


A semana é também marcada pela morte do príncipe Rainier III do Mónaco, vítima de doença prolongada, chefe de estado do mais pequeno estado do mundo. Durante o seu reinado, o pequeno principado, foi aceite como membro das Nações Unidas e viu a sua posição de estado sair reforçada. Na linha de sucessão encontra-se o príncipe Alberto, que rege o principado desde o internamento do seu pai.


No plano interno, o Presidente da República decidiu vetar uma série de diplomas aprovados pelo anterior governo, e que segundo Jorge Sampaio deveriam ser aprovados pelo governo de José Sócrates. Entre os diplomas vetados encontra-se o diploma que aprova o estabelecimento da zona de jogo da Serra da Estrela, projecto aprovado pela Inspecção Geral de Jogos, e já com prazos definidos para o início das obras do novo casino. Mais uma vez se percebe porque é tão dificil agilizar a função pública e os processos de decisão.

Iniciaram-se também os trabalhos da sétima revisão constitucional na Assembleia da República, que se destinam a tornar possível o referendo a Tratados Europeus e a permitir a coincidência de referendos com eleições gerais.

4 de abril de 2005

O Elogio do Sacrifício

Por Miguel Portas

No momento em que escrevo, o estado de saúde de João Paulo II é muito precário. O eclesiástico das más notícias já se encontra em Roma e, a 31 de Março, foram dados os últimos sacramentos. Mesmo que o Papa recupere momentaneamente, a doença de Parkinson avançou o suficiente para que o destino siga as leis da vida. Nesta circunstância, hesitei em escrever. Estas linhas serão sempre interpretadas como as de um texto fúnebre avant la lettre. Corro, no entanto, o risco. Porque é ainda em vida que posso escrever com franqueza sobre a ambivalência que a figura deste Papa me suscita.

Primeiro, o aviso como sabem, não sou cristão. Recorro a uma frase que Karol Wojtyla proferiu em Roma, na viragem do século: "Pela primeira vez na História da Humanidade, há um homem que vive como se Deus não existisse: o homem europeu." Eu pertenço a esse homem. E no entanto a este homem nem João Paulo II nem o seu Deus são indiferentes.

Segundo, a advertência apesar de ateu, penso que a religião não é uma questão exclusiva do foro privado de cada um(a) dos seus praticantes. Deus - o deus que cada crente faz seu - é privado. Mas a religião é uma invenção humana. A mais perene e poderosa delas. Para o pior e o melhor, só pode existir no espaço público. A necessária separação entre Estado e religião não é a remissão desta última a qualquer "gineceu" dos tempos modernos. Por dois motivos sucessivos: porque pode a religião recuar entre o Homem, nomeadamente o europeu, mas nem por isso a religiosidade diminuir. E porque a religião é uma história milenar de poder. A importância de João Paulo II é, aliás, a que decorre de uma marcante intervenção no espaço público ao longo de um quarto de século. Marcante e coerente, acrescente-se.

A citação a que recorri define a preocupação central deste Papa. Dela decorre todo um programa evangélico e político. O fio invisível que liga o seu anticomunismo dos primórdios à actual recusa da guerra preventiva, é uma leitura preocupada e angustiada sobre os tempos modernos que prescindem de Deus. E é essa difícil relação com o processo de laicização das sociedades ao longo do século XX que igualmente explica o seu conservadorismo em matéria de hábitos. Ou a defesa das prerrogativas indevidas que a Igreja ainda mantém em muitos países.

As posições antiquadas que a instituição continua a ter sobre preservativo, aborto, escolha sexual ou até o lugar da mulher na própria Igreja não a ajudaram particularmente. Nem o facto de a hierarquia continuar a pensar que os critérios morais que reclama para os seus devem ter força de lei para todos.

Não partilho do diagnóstico. Não é a Igreja que está bem num mundo que piora. Ao contrário, julgo que a Igreja precisa de mudar para que o mundo melhore. Mas sei reconhecer a mudança onde existe. Em particular nos últimos anos, João Paulo II teve a coragem de de-senvolver uma crítica sistemática da guerra. Chamou insistentemente a atenção para as injustiças geradas pela civilização individualista do capitalismo. Teve a lucidez de contrariar quantos queriam - e querem - levar o mundo para um real choque de tradições civilizacionais. E assumiu uma posição muito digna sobre os fenómenos da imigração, ao arrepio do cinismo das políticas dominantes. Este legado é inestimável. Porque ao longo da História da Igreja não foram muitos os Papas que puseram as pombas brancas a voar na Praça de São Pedro. Mais que o seu diagnóstico sofrido sobre a vida, conta o modo como se entregou ao seu mundo. Ele é "o incansável". Mesmo na doença, e principalmente nela, assume, até ao último suspiro, o rosto do sacrifício. Há algo de "desumano" - ou "sobre-humano" - nestes dias finais, na voz que se esvai e na janela que fala, silenciosa.

Uma igreja mais gentil teria convencido o seu Papa à resignação. Mas a insistência deste é um epílogo que entendo - à altura do desafio que a si próprio se atribuiu. É o elo que, simbolicamente, une a sua missão ao momento fundador da tradição cristã. Que tal ocorra em plena quadra pascal apenas acrescenta força à obstinada vontade dos últimos dias. Respeito e admiração, portanto. Até no adeus foi consistente com a sua vida.

2 de abril de 2005

Morte do Papa João Paulo II

O Papa João Paulo II morreu hoje às 21h37, hora de Itália, 20h37 em Lisboa.

Morre aos 84 anos, depois de ter sido o Papa peregrino, de ter levado a fé católica e a mensagem de cristo até aos confins do mundo, depois de um incanssável trabalho de evangelização.
Morre depois de ter sobrevivido a um atentado em 1981, de ter suportado a doença de Parkinson desde finais dos anos 80 e desde o princípio deste ano problemas respiratórios.

O anúncio foi feito pelo Vaticano.
Fecha-se assim um pontificado iniciado há 27 anos, a 16 de Outubro de 1978

Deus Guarde O Papa!

31 de março de 2005

Vida Ou Morte De Schiavo?

Quem pode decidir, em consciência, a vida ou morte de Terri Schiavo, uma mulher de 41 anos que após um AVC se encontra em estado vegetativo há 15 anos? Alguém pode dispor desse poder?

A história, que está a apaixonar os EUA e a Europa, resume-se a isto: o marido conseguiu que um juiz estadual autorizasse que lhe fosse retirado o tubo que a alimenta artificialmente, o que conduzirá à sua morte, em agonia lenta, nos próximos 15 dias.
Os pais de Terri, por sua vez, e invocando a sua incapacidade de exprimir o que quer, em consciência plena das suas faculdades pediram a um juiz federal que ordenasse a recolocação da alimentação artificial, pedido que foi ontem recusado.

Para se chegar até aqui, o caso envolveu a Câmara dos Representantes e o próprio Presidente Bush, que assinou, na sexta-feira, uma lei que determina que casos destes só podem ser decididos por juízes e tribunais superiores. Foi uma boa tentativa, mas sem efeito, de momento.
A batalha legal ainda não terminou, e os argumentos são cruzados mas importantes para reflectir. O marido de Terri invoca o desejo da sua mulher, que, não podendo esprimi-lo há 15 anos, se baseia em comentários com amigas quando casos idênticos eram noticiados. Os pais, por sua vez, e lembrando a sua qualidade de católica romana, garantem que ela jamais tomaria essa decisão, baseados nos dogmas da igreja.
Bush, para explicar a sua decisão inédita, mas não possuindo poderes para mandar recolocar o tubo de alimentação, argumentou que em caso de uma decisão errada, que até poderia ser, na opinião do marido, ela seria sempre aceitável e minimizada pelo facto de se ter optado pela vida. "É preferível errar em nome da vida do que da morte."

Quem tem poderes nesta Terra, para ordenar a morte de Terri Schiavo? Um Juiz? O marido, baseado em conversas da amigas?
Sendo católica romana e acreditando nos dogmas da fé, poruqe não deixar que Deus decida por Schiavo?
Matá-la, assim, à fome e sede, numa agonia horrorosa, é desumano, cruel, insensato e arrepiante.


Luís Delgado in Linhas Direitas, Diário de Notícias 23 de Março de 2005

30 de março de 2005

Canto Primeiro

As armas e os barões assinalados,
Que da Occidental praia Lusitana,
Por mares nunca d'antes navegados,
Passaram inda além da Taprobana,
Em perigos e guerras esforçados,
Mais do que promettia a força humana,
Entre gente remota edificaram
Novo reino que tanto sublimaram;

in Os Lusíadas de Luiz de Camões,
(retirado da edição da Livraria Figueirinhas, Porto 1907)