27 de junho de 2005

Agricultura, Alimentação e Saúde

Portugal Desperdiça Recursos Hídricos

Portugal continua a desperdiçar recursos hídricos como nenhum outro país da Europa, afirma o agrónomo António Campos, a propósito do livro «Agricultura, Alimentação e Saúde», a lançar na terça-feira pela editora Âncora, em co-autoria com Rui Azevedo.

António Campos chama a atenção para o agravamento das carências de água em algumas zonas do território português e para o avanço da desertificação no Sul, agravada pelos incêndios e pela erosão progressiva dos terrenos.

«Em Portugal, o problema da gestão dos recursos hídricos reveste contornos escandalosos porque os cursos de água não têm nenhum tipo de manutenção, de cuidados de defesa e de ordenamento nas suas margens, e a política florestal nacional é um atentado contra a água», sustenta.

Focando o caso específico do Alentejo e Algarve, o antigo eurodeputado socialista considera «uma irresponsabilidade política o fomento dos campos de golfe» naquelas regiões, onde a água assume uma importância decisiva.

Para além de legislação penalizadora para os grandes gastadores de água, Campos defende a intensificação do tratamento e reaproveitamento das águas dos esgotos urbanos, reportando-se à experiência de vários países da Europa onde se verifica uma gestão equilibrada de tais procedimentos, nomeadamente no caso dos espaços verdes urbanos, que são «irrigados com estas águas, que voltam a ter qualidade adequada depois de tratadas».

A dessalinização é outra alternativa que o autor acha necessário reequacionar, admitindo que «a prazo» há-de encontrar-se a forma de «transformar, a baixo preço, a água do mar em água potável», devendo até lá imperar a gestão sustentada deste recurso natural.

No capítulo dedicado ao modelo alimentar dos países desenvolvidos, o autor destaca que nesses países as «pessoas só consomem directamente 30 por cento dos cereais produzidos, destinando-se os restantes 70 por cento ao fabrico de rações para fomentar a produção intensiva de carne e leite», ficando a «matéria verde, cada vez mais destinada a ser destruída pelo fogo», quando podia ser usada na alimentação dos herbívoros, principalmente vacas, cabras e ovelhas. «Em vez disso, o modelo vigente promove que os animais sejam alimentados a rações», comenta.

António Campos critica as grandes empresas do sector agro-alimentar, que «promoveram um desenvolvimento fantástico da cadeia alimentar e a concentração da comercialização em multinacionais poderosíssimas», efectuando uma «integração vertical do sector, principalmente nas grandes produções objecto do comércio a longa distância», designadamente cereais, carne, oleaginosas, café, bananas e chá. E apresenta um gráfico das maiores dez multinacionais do ramo agro-alimentar, com as vendas anuais lideradas pela Cargill (EUA), com 55 mil milhões de euros, seguida da Nestlé (Suíça) e da Kraft (EUA), ambas com 42 mil milhões, da Unilever (Holanda/Reino Unido) com 32 mil milhões; depois, as norte-americanas Con Agra e a Pepsico, ambas com 30 mil milhões de euros de facturação anual.

António Campos é engenheiro técnico agrário e foi membro de vários governos do Partido Socialista - secretário de Estado do Fomento Agrário, secretário de Estado da Estruturação Agrária e secretário de Estado adjunto do primeiro-ministro. Rui Azevedo é agrónomo de formação e actualmente funcionário da Comissão Europeia. O prefácio é de Mário.




in Expresso Online, 27 Junho 2005 (15:05)

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